Vontades coletivas e violência popular, Néstor Kohan

somos de acá
2 min readDec 28, 2020

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Trecho traduzido do original ‘Logros colectivos y violencia popular’, extraído de ‘Sociedad colonial y independencia en nuestra America’, publicado em Euskal Herriko Kommunistak.

Aquelas revoluções de independência e as guerras de liberação que foram possíveis daqui até a Patagônia se desenvolveram sozinhas, de forma espontânea, com um piloto automático? Surgiram do nada como uma planta perdida no meio do campo quando chove? Como se conforma uma vontade coletiva de alcance não só nacional, mas também continental para lançar-se à luta a partir de um processo política e socialmente tão ambicioso? Durante os últimos anos, na mão do pós-modernismo e seus derivados, se colocou na moda cantar louvores de ‘pura espontaneidade’ das multidões. Como se as revoluções — e as grandes confrontações que duram décadas lutando contra um império — puderam desenvolver-se e concretizar-se sem planos, projetos, estratégias, sem quadros políticos, sem orientações, sem ideologia e sem organização. Nenhuma revolução histórica se desenvolveu desta maneira. As revoluções da independência americana e nossas guerras de libertação tampouco. Não se pode combater 44 anos de exploração quase ininterrupta sem coordenação nem ideologia nem planos. Essas guerras, rebeliões e revoluções foram possíveis porque houve planos, estratégias, organizações políticas e sobretudo operacionais, por exemplo, e também porque existiam ideologias que convocavam à desobediência e à revolução, legitimando o exercício da violência revolucionária numa escala continental e possibilitando a resposta do campo patriota contra a violência colonial, então oficializada e legalizada pela ordem estabelecida. Os líderes independentistas só passaram a ser chamados de ‘heróis’ e a ter estátuas de bronze nas escolas e praças depois de triunfar. Antes, os chamavam de ‘revoltosos’, ‘infiéis’, ‘jacobinos’, ‘insurgentes’, ‘impuros’, ‘subversivos’… Soa familiar?

Muitas impugnações dos últimos tempos contra os revolucionários independentistas de 1810, na verdade estão motivadas pelo rechaço atual à violência popular, plebeia e revolucionária. Estas vozes oficiais — jornalistas, historiadores, novelistas, filósofos, advogados — que arremetem contra Bolívar, na verdade tem em mente as forças insurgentes e aos movimentos sociais rebeldes do século XXI. Usam como pretexto a impugnação dos rebeldes mais radicais dos séculos 18 e 19 para demonizar, satanizar e estigmatizar os revolucionários e à insurgência do século XXI.

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