a vida e a morte da minha mãe [2023]
queria que você vivesse pra sempre
caminhando malandreada pela praia
ou correndo revolta nos estádios de futebol
queria que você não precisasse subir escadas,
que nunca tivesse calejado as mãos,
que o único sal a molhar teu rosto fosse do mar,
que seus órgãos vitais não fossem mortais,
queria que você fosse eterna, como seus exemplos são
não há nada de justo em te tirar daqui,
levar a bondade pro sol e deixar a maldade no vento
mas sei que nada dura frente ao tempo,
e tampouco deve ser perene o seu sofrimento
o que fica são tuas palavras,
nossas fotografias
e as trincheiras que juntos cavamos
sei que você está cansada, que foram muitos anos,
que a dor não passa e que não fazemos mais planos
sinto muito se a comida perdeu o sabor,
se as gotas de chuva não te molham,
se o seu sangue bombeia mais fraco.
sinto muito se o brilho de todas as suas cores,
vivo e nítido,
agora ficou fosco e opaco.
queria poder arrancar a agonia do seu estômago,
tirar o pessimismo do seu âmago,
queria que no lugar da náusea, o respiro te desse fôlego e ânimo.
você esteve lá, nas duas noites do meu nascimento
de chinelo e meia
de touca para cobrir a queda dos fios de cabelo
me segurando, suportando minha ascensão com as pontas dos seus dedos
muito meus olhos já choraram em negação, com medo do futuro à frente,
na linha limite de desejar voltar ao seu ventre,
espero que você não tenha os mesmos medos que eu;
se estiver na porta, não hesite e entre
mas eu,
que pouco ou nada tenho,
daria tudo que posso pra que você vivesse pra sempre.
Teylor Lourival